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Atualizado em 26 DE outubro DE 2011 ás 14:42

Esponjas mostram níveis de poluição no litoral da Bahia

Projeto de transferência de conhecimento entre pesquisadores brasileiros e cubanos tem o objetivo de desenvolver metodologias de monitoramento dos níveis de poluição do entorno de Salvador e da Ilha de Itaparica

Por Luana Assiz
luanassiz@gmail.com

O que há em comum entre as águas dos litorais da Bahia e de Cuba? Se, por um lado, as baías de Todos os Santos (BTS), em Salvador, e de Havana estão nos limites sul e norte, respectivamente, de uma zona subtropical, por outro, as faunas marítimas dessas regiões têm muitas semelhanças. O que isso significa? É esse o ponto de partida de um projeto de transferência de conhecimento entre pesquisadores brasileiros e cubanos, cujo objetivo é desenvolver metodologias de monitoramento dos níveis de poluição do entorno de Salvador e da Ilha de Itaparica, além de outros municípios do interior da BTS.

O pontapé inicial desse projeto é o mini-curso “Emprego de invertebrados marinhos como indicadores ambientais em recifes de corais”, que será ministrado pelos professores doutores Pedro Alcolado Menéndez, do Instituto de Oceanologia de Cuba e Carla Menegola, da Universidade Federal da Bahia (Ufba), no 29º Congresso Brasileiro de Zoologia, de 5 a 9 de março de 2012.

“O mini-curso será também uma forma de convidar estudantes que queiram se engajar no estudo das áreas de ciências marinhas. Já existe um acordo de colaboração entre o Instituto de Oceanologia de Cuba e a Ufba, que pode beneficiar não apenas o Instituto de Biologia, mas outros setores, como cursos de Geografia e Oceanografia (do Instituto de Geociências)”, afirma a professora doutora Carla Menegola.

A proposta de interação científica está fundamentada no projeto “Escubra: Esponjas de Cuba e Brasil – Taxonomia, Biogeografia e Emprego como indicadores de poluição”. A idéia central do projeto é que os pesquisadores cubanos capacitem os integrantes do Labpor – Laboratório de Porífera e Fauna Associada da Ufba, principalmente no que diz respeito a técnicas de amostragem e mapeamento de espécies indicadoras de poluição. Em contrapartida, os zoólogos brasileiros formarão taxonomistas (estudiosos que nomeiam e classificam os seres vivos) em Cuba, onde existe uma alta diversidade de esponjas, mas faltam especialistas que detenham conhecimento sobre essas espécies.

O que as esponjas mostram - O uso de invertebrados marinhos como indicadores ambientais em recifes de corais funciona da seguinte maneira: nos locais onde há possibilidade de haver fontes de contaminação, são selecionados pontos que constituam gradientes para avaliar essa contaminação. Os gradientes são locais estratégicos mapeados pelos pesquisadores, com perímetros variáveis a depender das características das fontes poluidoras, nos quais se reconhecem distintos níveis de poluição. “São lugares onde se conhece previamente as fontes poluidoras: um emissário submarino ou um deságüe de esgoto que deveria ser pluvial mas que pode eventualmente ser ligada a uma rede de esgoto clandestina, e de cujas fontes se incluem pontos gradualmente equidistantes”, detalha Carla Menegola.

Há diversos grupos de animais que podem ser usados como indicadores de contaminação marinha e de água doce. As bases de avaliação do mini-curso serão as esponjas e corais, que constroem as plataformas de recifes e por isso são importantes para a manutenção da vida marinha que se desenvolvem ao redor, quanto os corais moles, chamados octocorais ou gorgônias (animais resistentes, que em geral toleram bem a exposição à luz solar e suportam altos níveis de poluentes na água).

Esponja Salmon, espécie bioindicadora de contaminação marinha, presentes de Cuba a costa brasileira

As esponjas são animais filtradores e absorvem determinados tipos de poluentes, que ficam retidos em suas células, a exemplo de alguns metais pesados, e, mesmo assim, são capazes de se reabilitar e continuar vivendo. Uma das formas de verificar a poluição marinha é fazer um estudo histológico ou químico para verificar os tipos de poluentes que ocorrem nos tecidos. Esse método requer um monitoramento por diversos anos – ou um acompanhamento que comece preferencialmente antes da existência da fonte poluidora ao ponto pesquisado, para haver um parâmetro de comparação.

A outra forma de fazer com as esponjas uma averiguação de contaminação marinha é através do levantamento da estrutura das comunidades, o que a maioria dos trabalhos científicos vem fazendo, porque esse trabalho demanda um tempo de levantamento menor, não exige conhecimento prévio da composição faunística ali presente e oferece respostas imediatas a partir de levantamentos que podem ser muito rápidos e de baixo custo.

“Há espécies de esponjas que são indicadoras de poluição pelo simples fato de estarem ali. A gente sabe disso, porque existem modelos validados para outros países, o que significa dizer que se uma determinada espécie que é resistente à poluição e se alimenta daquelas bactérias que estão presentes principalmente na matéria orgânica de origem animal que está sendo decomposta em determinado esgoto ou fonte contaminante, isso já nos diz muita coisa num simples levantamento de poucas horas ou alguns dias”, afirma Carla. A validação de modelos que detectam a presença de poluentes será a chave do projeto de cooperação entre Bahia e Cuba, que começará no mini-curso.

Mapeamento - Na Baía de Todos os Santos serão mapeados cerca de seis pontos do litoral sul: nas ilhas de Maré e dos Frades, no entorno de Itaparica – na face voltada para a costa oceânica, em um ponto próximo a Morro de São Paulo e Boipeba e na reserva de Abrolhos. A duração de todo o processo depende do regime de chuvas característico da região, uma vez que os recifes são rasos e a chuva muda as condições de visibilidade da água e o nível de sedimentação, condições não favoráveis para mergulho.

Os trabalhos devem começar este mês de outubro e aproveitar as condições climáticas do verão. “É muito difícil prever que isso tudo vá ser feito em uma única estação, porque a gente precisa ter um parâmetro de comparação. Um projeto de pesquisa como esse tem como duração ideal mínima de 2 anos para compilação dos primeiros dados obtidos”, calcula a pesquisadora.

Após a coleta, inicia-se a fase de análise dos dados para buscar similaridades entre os pontos, com base em vários índices ecológicos. “Se houver publicações que permitam estabelecer uma correlação confiável dos resultados obtidos a partir de reconhecidas fontes de contaminação, ótimo. Em caso negativo, será preciso ainda mapear a natureza dos poluentes em alguns pontos no interior da Baía de Todos os Santos”, completa.

Um dos objetivos da interação inédita entre especialistas dessa área do Brasil e do Caribe é a padronização dos nomes das espécies, para não haver riscos de que os dados não sejam compatíveis. “É um projeto de longo prazo, afinal, as esponjas são animais de forma externa extremamente variável em muitos casos, podendo variar de acordo com o tipo de substrato, então, o objetivo é criar uma rede de colaboração com pesquisadores de outras instituições brasileiras e do Caribe, na tentativa de resolver ou ao menos minimizar esses problemas taxonômicos”, prevê.

Custos – Um projeto de monitoramento costeiro com uso de esponjas e corais com indicadores ambientais custa em média R$ 100 mil, mas os recursos disponíveis variam de acordo com editais propostos pelos agentes financiadores estaduais e federais. No projeto de cooperação entre a Ufba e o Instituto de Oceanologia de Cuba, aguarda-se que a Capes, CNPq ou Fapesb aprovem o financiamento de viagens para os estudantes e pesquisadores cubanos virem atuar no Brasil e os brasileiros possam cooperar com a pesquisa cientifica em Cuba, num total de quatro viagens, uma por ano para cada país por dois anos.

Resultados – Um dos pontos em que há presença de contaminantes é a praia da Boa Viagem, em Salvador, onde existe um deságüe de águas próximo a um recife raso que permite a realização desse trabalho pela alta cobertura de esponjas. Em outros pontos bastante frequentados por banhistas, como o Porto da Barra, também são esperados altos índices de poluição.

O material produzido pela pesquisa será reunido em publicações cientificas, que, para Carla, podem funcionar como boas armas nas mãos de pessoas que gerenciam políticas de manejo de áreas costeiras. “Essa interface entre universidade e poder público precisa ser melhor conduzida, por falta de informação. A própria reitoria da universidade muitas vezes não sabe o que está acontecendo dentro da instituição”, critica. O resultado do trabalho será compilado em um livro sobre a diversidade de esponjas do Brasil e de Cuba.

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Um comentário a Esponjas mostram níveis de poluição no litoral da Bahia

  1. Ana Maria disse:

    Excelente matéria. Parabéns!

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