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Atualizado em 8 DE maio DE 2018 ás 21:02

Oxum e o poder do feminino no Candomblé

Evento realizado na UFBA reuniu a sacerdotisas do Brasil e da Nigéria para discutir sobre a relevância do orixá feminino no Candomblé e a importância da valorização dos cultos religiosos de matriz africana

GIOVANNA HEMERLY*
Gihe296@gmail.com

Segundo a tradição Iorubá, os orixás são ancestrais africanos sagrados que representam manifestações das forças da natureza e valores humanos, como a justiça e o amor. Cada divindade possui suas características e simbolismo próprio que constituem um arquétipo relacionado com o tipo de rito utilizado para cultuá-lo. Dentre os principais orixás cultuados pelas religiões de matriz africana está Oxum, também conhecida como Senhora do Ouro, Mãe d’água, Rainha das Cachoeiras, Orixá do Amor. Os aspectos e a importância desta divindade do panteão africano foram discutidos durante o evento “Quem é Oxum? Diálogos Brasil-Nigéria”, organizado pelo Goethe Institut em parceria com o Programa de Pós-Graduação em antropologia da UFBA (PPGA-UFBA).

O evento aconteceu no auditório Raul Seixas da faculdade de Filosofia da UFBA (FFCH-UFBA) / Imagem: Giovanna Hemerly

Sagrado Feminino - “Oxum” é um termo que vem da língua iorubá, tendo como origem o nome do rio Osun, localizado no sudoeste da Nigéria. Não por coincidência, Oxum é considerada dona das águas doces tanto no Candomblé quanto na Umbanda (religião na qual é sincretizada com Nossa Senhora da Conceição, santa católica). A orixá representa o poder feminino através do arquétipo da mulher elegante e amorosa, mas também inteligente, determinada, persistente, desinibida e senhora da fertilidade. Esse último aspecto inclusive lhe associa à maternidade, já que é considerada a protetora do feto durante o processo de gestação, além de possuir forte afeição por crianças. Outros aspectos que relacionam-se com ela são a riqueza, o amor, a prosperidade, a beleza e a sensualidade.

Mãe Walquíria d’Oxum, integrante do conselho religioso da Casa de Oxumaré e mãe de santo há quase 60 anos, conta durante o evento sobre os atributos principais da orixá e sua importância para o Candomblé. Segundo ela, Oxum, por ser associada a água doce, é a senhora das águas da vida, já que a substância é essencial para a perpetuação dos seres vivos no planeta. “Ela é dona da fertilidade, protetora do amor, inventora do Candomblé, é menina dos olhos de Oxalá [orixá que está acima dos demais na hierarquia divina]. Oxum é a rainha das águas doces, sem ela ninguém vive”, conta a mãe de santo.

Para Mãe Valquíria d’Oxum, a água doce é um dos elementos fundamentais na representação da Orixá por estar associada ao poder de gerar de vida / Imagem: Giovanna Hemerly

No Brasil, Iemanjá, outra orixá das religiões de matriz africana, também recebe o título de  “rainha das águas”. No entanto, os praticantes do Candomblé brasileiro associaram esta orixá às águas do mar, deixando as águas dos rios em domínio de Oxum. Mas durante sua palestra, a princesa da cidade de Osogbo (Nigéria), Adedoyin Talabi Faniyi, alta sacerdotisa de Oxum e mestre em estudos africanos pela Universidade de Ibadan, ressalta que em seu país, Iemanjá também é um orixá de rio. Desta forma, a diferença seria entre o tipo de rio, sendo o de Oxum mais sinuoso e de regiões do interior, enquanto que os de Iemanjá são os que correm em regiões mais próximas do mar.

Compartilhamento de saberes - A sacerdotisa, que também é bacharel em Artes pela Universidade de Ilorin, participa do Programa de Residências Vila Sul do Goethe Institut, que visa promover o intercâmbio cultural com artistas interessados na cultura Sul-Americana. A princesa contou que sua participação em um evento que busca manter um diálogo entre Brasil e Nigéria, faz parte de sua missão como sacerdotisa, já que, além de poder estabelecer conexões entre a Nigéria e culturas remanescentes da diáspora africana, esta é também uma grande oportunidade para promover a importância da preservação e valorização cultural das religiões de matriz africana, especialmente nas universidades.

Durante o evento, a sacerdotisa Adedoyin Faniyi mostrou os principais símbolos associados a Oxum, explicando sua representação no Candomblé / Imagem: Giovanna Hemerly

Em entrevista para Agência de Notícias Ciência e Cultura, Adedoyin Faniyi afirma não encontrar dificuldade na hora de relacionar os conhecimentos científicos acadêmicos com os conhecimentos religiosos. No entanto, o que é mais difícil de lidar é com relação a desvalorização que as pessoas fazem do conhecimento, dificultando assim o compartilhamento de saberes.

Casa de Oxum - A Nigéria, país de origem da princesa Adedoyin Faniyi, foi onde o Candomblé surgiu. É na cidade de Osogbo, localizada na região sudoeste do país, que está situado um dos mais importantes templo dedicado a Oxum, local onde acontecem todos os anos o “Osun-Osogbo Sacred Grove Festival” (Festival sagrado de Osun). O Templo, que é considerado Patrimônio Mundial da UNESCO desde 2005, fica próximo ao rio Osun, que tem suas águas consideradas sagradas por pertencer a orixá.

*Estudante de jornalismo da Faculdade de Comunicação e repórter da Agência de Notícias em CT&I – Ciência e Cultura UFBA

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