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Atualizado em 31 DE maio DE 2011 ás 13:37

Décio Torres Cruz

Doutor em Literatura Comparada, professor da Ufba e Uneb e Bolsista de pós - doutorado na Inglaterra relata dia a dia de um pesquisador no exterior

Por Juliana Alves*
julyy-alves@bol.com.br

Ciência e Cultura – Quais as dificuldades que o brasileiro enfrenta para fazer pesquisa na Inglaterra?

Décio Torres Cruz - Não diria que enfrentamos dificuldades relacionadas à pesquisa em si, mas as dificuldades são mais de ordem prática, da instalação e da organização das tarefas do dia-a-dia. Ao chegar, a burocracia para abrir uma conta em um banco local para que o dinheiro da bolsa seja depositado é complicada, uma vez que você tem que ter uma prova de residência, o que não é comprovado com apenas uma correspondência.

A carta do CNPq, que garante o recebimento de uma bolsa mensal, não dispensa a prova de endereço. Você tem que ter um contrato de aluguel ou contas de telefone e eletricidade em seu nome, o que é impossível logo na chegada.

No meu caso, como aluguei um quarto na casa de um amigo, não tinha um contrato oficial e tive que solicitar uma carta de meu orientador confirmando o meu endereço. Ele escreveu a carta em papel timbrado da universidade, mas escreveu à mão e a gerente do banco não aceitou, pois teria que ser digitada e carimbada. Somente depois de muita insistência e depois de ter mostrado a carteira de professor visitante da universidade que havia recebido pelo correio (o envelope timbrado e carimbado pelo correio não serve como prova de endereço) é que ela resolveu abrir uma conta em meu nome.

Enfrentei o mesmo problema no registro de endereço na polícia. Mesmo com visto de professor visitante/pesquisador acadêmico, temos uma semana após a entrada no país para nos registrarmos na polícia de imigração e também necessitamos de uma prova de residência. Outro problema está relacionado ao clima. Se a pessoa chega no início do inverno, como foi o meu caso, é bastante frio e o dia dura pouquíssimo: a claridade começa às 9h e acaba às 16h, o que provoca a sensação de pouco tempo.

Quanto à minha pesquisa, encontrei todo o material que precisava e preciso. Como estou trabalhando com representações fílmicas de obras literárias, acabei encontrando muito mais material do que esperava; nas bibliotecas públicas, nas universidades, e nas livrarias e lojas de DVD. As diversas livrarias da cidade, do British Film Institute, do National Theatre, do Royal Shakespeare Company em Stratford e as diversas redes de DVD aqui possuem excelentes materiais para qualquer pesquisador da minha área. A dificuldade futura será como levar todo esse material adquirido (livros e DVDs) para o Brasil.

Ciência e Cultura – A bolsa para pesquisador é suficiente para cobrir despesas de pesquisa e infraestrutura para viver?

Décio Torres Cruz – Você só pode entrar no país com a garantia de que vai poder se manter e isso tem que ser assegurado por uma bolsa na hora do pedido de visto. Aluguel e transporte na Inglaterra é muito caro e se a pessoa aluga um apartamento, o dinheiro da bolsa poderá ir quase todo no aluguel. Por isso, a maioria das pessoas aqui aluga um quarto e divide as dependências da casa ou apartamento com outros moradores. O gasto mensal com transporte (metrô e ônibus) sai mais em conta se você paga por mês, em vez de pagar por cada viagem. Passagens de trem são relativamente caras e você deve adquiri-las com antecedência para obter desconto, senão corre o perigo de pagar por uma única passagem quase o mesmo preço que se paga por um mês de transporte. Toda vez que tenho encontros com o meu orientador tenho que pegar trem e me deslocar até Leeds. Dentro do padrão a que me submeti, o dinheiro é suficiente, mas não seria se tivesse alugado um estúdio para morar sozinho.

Ciência e Cultura – Quais as dicas para fazer uma boa pesquisa fora do país?

Décio Torres Cruz – Escrever um bom projeto, com objetivos bastante claros, definir bem o orientador e o que você quer fazer e manter o foco para não perder tempo com caminhos desnecessários.

Ciência e Cultura – Do que trata sua pesquisa na Inglaterra e qual a importância desses estudos para o Brasil?

Décio Torres Cruz – Estou pesquisando sexualidade e gênero nas representações fílmicas da obra de William Shakespeare, mais especificamente da peça Macbeth. O objetivo final é a publicação de um livro sobre o assunto, que poderá ser utilizado por pessoas que estudam as seguintes áreas: tradução intersemiótica, literatura, filme, teoria literária, narratologia, teatro e gênero.

O simples fato de estar aqui me possibilitou descobrir um material que jamais teria acesso no Brasil. Isso vai se refletir não só nas minhas aulas de literatura e filme, que serão bastante enriquecidas com o material que estou adquirindo aqui, mas também estou ampliando o acervo fílmico que uso com os meus orientandos nos grupos de pesquisa de literatura e cinema. Essa pesquisa é de importância também no sentido de estabelecermos laços com outros professores de universidades locais, divulgando as nossas pesquisas e a nossa universidade e cultura no exterior.

Fiz duas palestras na Universidade de Leeds, uma delas sobre literatura e cinema brasileiros sob uma perspectiva histórica para professores e alunos de graduação e pós-graduação. A outra foi sobre a minha pesquisa para um grupo de alunos do meu orientador, alunos de mestrado que estudam a obra shakespeariana. (cf. notas do Ufba em Pauta). Além disso, estarei apresentando um trabalho sobre a minha pesquisa em um congresso de Tradução e Mídia que irá ocorrer no final do mês de junho, organizado por um grupo de professores da Imperial College aqui de Londres.

*Estudande de Jornalismo da Faculdade de Comunicação da Ufba – Facom

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