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Atualizado em 2 DE maio DE 2013 ás 19:21

Alessandra Santana Soares e Barros

POR RITA DE CÁSSIA MARTINS*
rc.martins@live.com

A professora da Faculdade de Educação da UFBAAlessandra Barros, coordena o Centro de Estudos sobre Recreação, Escolarização e Lazer em Enfermarias Pediátricas (CERELEPe). Em entrevista à Agência Ciência e Cultura, ela esclarece questões sobre as classes hospitalares e revela alguns dos resultados obtidos através do projeto desenvolvido no Centro Pediátrico Hosannah de Oliveira, em Salvador.

Ciência e Cultura – Existe uma resolução do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, que garante o direito ao acompanhamento do currículo escolar durante a permanência no hospital. Essa resolução é respeitada?

Alessandra Barros - Como ela não institui uma política pública, ela não é muito respeitada porque na prática os hospitais públicos e, por conseguinte as secretarias municipais ou estaduais de educação, que deveriam prover os professores de ensino fundamental para os respectivos hospitais, só fazem à medida que há uma demanda por parte de ONGs, de universidades ou de professores da secretaria quando, na verdade, não deveria ser necessária essa iniciativa isolada de pessoas.

Ciência e Cultura – Os hospitais são receptivos a esse tipo de serviço?

Alessandra Barros - Quando os hospitais são procurados são muito receptivos. O que tem que ser relativizado é que ser receptivo não significa necessariamente que vá se garantir a melhor condição material para a classe hospitalar. Têm hospitais que são receptivos porque acolhem os profissionais de maneira respeitosa, porque exaltam a qualidade do serviço, porque valorizam, mas existem hospitais que, além disso, separam um espaço determinado, provém algum recurso material. Então, existem modos diferentes de ser receptivo.

Ciência e Cultura – Em salvador quantos hospitais possuem classes hospitalares?

Alessandra Barros - Ao todo são 15 hospitais, dos quais 13 contam com professores da prefeitura e dois outros, o Hospital das Clínicas e o hospital SARAH, cujos professores não são da prefeitura e sim do próprio quadro do hospital. Então, em Salvador existem 15 hospitais, mais quatro casas de apoio, que são ONGs associadas aos hospitais, além do atendimento em domicílio.

Ciência e Cultura – Existe um tipo de doença que determina o acesso dessas crianças a esse serviço?

Alessandra Barros - Não. A primeira legislação falava da permanência por mais de 15 dias, mas de lá pra cá essa duração do tempo de internação deixou de ser relevante, o que se considera são mais questões de natureza prática, por exemplo, uma criança que vai ficar três dias internada é muito pouco tempo para que ela consiga passar por todos os profissionais e chegar até o professor. Então, às vezes, em tão pouco tempo, ela não vai ser atendida, mas não porque ela tenha sido preterida pelo serviço. Ela não vai ser atendida porque o tempo é tão pouco e ela tem outras prioridades.

Ciência e Cultura – A metodologia usada no ambiente hospitalar é diferente da metodologia utilizada na escola?

Alessandra Barros - Difere um pouco porque não há como se esperar que o tempo disponibilizado para essa criança seja o mesmo tempo que seria disponibilizado numa escola. Digamos que numa escola uma criança tem um turno de quatro horas a seu dispor, em uma enfermaria ela não tem turno de quatro horas à disposição de um professor porque os turnos são disputados por outros profissionais, que inclusive são prioritários, como enfermeiros, terapeutas, nutricionistas, médicos. O tempo disponível pra se intervir educacionalmente é sempre menor. Além de o tempo ser menor, a disposição da criança é menor também. Ela está sonolenta, ela não está bem-humorada, ela está deprimida, ou ela está enjoada ou de jejum.

Ciência e Cultura – Nesse sentido, há um trabalho em conjunto com psicólogos?

Alessandra Barros - Se esses profissionais existirem. Porque uma coisa é o que se pretende idealmente que a classe hospitalar seja, outra coisa é o que ela pode ser. Há uma diferença no provimento de recursos humanos para assistências paralelas. Há hospitais que têm psicólogos e assistentes sociais, outros não têm. Se aquela enfermaria pediátrica tem esses profissionais, aí há um diálogo bastante interessante e é bom que haja.

Ciência e Cultura – Nos hospitais de Salvador esses recursos estão disponíveis?

Alessandra Barros - Varia de hospital para hospital. Hospitais públicos têm diferenças históricas, diferenças de gestão, diferenças de captação de recurso. Então, isso vai se refletir também na oferta de insumo, livros, internet, computadores, jogos e de material escolar.

Ciência e Cultura – A senhora desenvolveu um projeto no Centro Pediátrico Professor Hosanah de Oliveira em 2008 e 2009. Quais os resultados desse projeto?

Alessandra Barros - A gente vem desenvolvendo. Então, os resultados nunca estarão dados definitivamente. Eles são relatados muito pela acolhida dos profissionais que, embora não tenha atestado isso cientificamente, sempre referem certa adesão das crianças à própria internação muito embora ela seja, em princípio, obrigada a estar internada. Então é como se ela resistisse menos às internações. Muitas vezes é possível identificar respostas satisfatórias até do ponto de vista do aprendizado. Uma criança que não lia tão bem já passa a ler ao cabo de três meses de internação. De maneira geral, os resultados são dessa ordem. Num plano, resultados relacionados à maior adesão às terapêuticas da assistência hospitalar, e no outro plano, resultados da ordem do ganho de aprendizado esperados para aquela idade. É claro que isso vai variar em função de quadros clínicos. É difícil comparar uma criança que está sentindo dor o tempo todo durante sua internação com outra que não está. Vai variar também em função até do background social. Eventualmente haverá melhores resultados com uma criança cuja mãe não é analfabeta se comparado com uma criança cuja mãe que é analfabeta. Existem esses quadros sociais bem distintos dento de uma mesma enfermaria.

Ciência e Cultura – Os professores levam em conta essas questões ao ensinar em classe hospitalar?

Alessandra Barros - Levam. Em geral, são professores que vêm da educação especial porque a classe hospitalar é uma submodalidade da educação especial. Então, são professores que já têm uma experiência teórico-acadêmica ou, muitas vezes, prática com alunos que têm necessidades especiais. Se não, são professores que, tendo já uma experiência significativa de sala de aula conhecem essa diversidade do alunado. No que tange as doenças especificamente, os professores são capacitados em cursos de extensão ou de especialização. Hoje, passados uns 30 anos que a classe hospitalar se arrasta enquanto modalidade educativa está mais fácil para um professor que se interesse pelo campo se capacitar.

* Rita de Cássia Martins é estudante de jornalismo da Faculdade de Comunicação da UFBA.

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