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Atualizado em 4 DE agosto DE 2012 ás 18:59

Você conhece o SUS?

Você já deve ter ouvido falar que o Sistema Único de Saúde (SUS) é considerado um dos melhores sistemas de saúde pública do mundo, um modelo que vários países querem copiar. Mas não, a proposta desta série não é afirmar isso. Tampouco que as críticas a ele são infundadas, há sim muitos motivos para reclamar. Só que isso não quer dizer que o SUS seja um sistema ruim. Parece contraditório, mas a verdade é que o SUS é assim: contraditório, cheio de vitórias e fracassos e injustamente desigual. O que você vai ver nessa série de matérias é um lado do SUS pouco conhecido pela maioria dos brasileiros. A luta e a revolução no conceito de saúde que possibilitaram a criação de um dos maiores sistemas de saúde pública do mundo. O que está por trás dos seus problemas, um embate político que dura anos. E as áreas não conhecidas como parte do sistema, ações de cuidado e proteção da sua saúde, muitas vezes invisíveis, mas que fazem com o SUS esteja presente nas mínimas ações do seu dia a dia. E com que todos sejam usuários do sistema.

POR INÊS COSTAL*

O que não é SUS?

O que vem a sua cabeça ao ouvir a sigla SUS? Se você pudesse responder a partir de uma lista, os termos pesquisa, proteção contra riscos ou vigilância seriam selecionados? E ao pensar em alguém usando o SUS? Você escolheria imagens de pessoas comendo ou escovando os dentes? Começar o texto com esse tipo de pergunta é um clichê, eu sei, mas as respostas tem motivado discussões e até o tema da última Conferência Nacional de Saúde. Você sabe o que é SUS? O Sistema Único de Saúde (SUS) foi criado há mais de 20 anos e concretizou uma revolução no acesso à saúde no país. Cuida da sua saúde de forma ampla e dificilmente não está presente no seu dia a dia.

O maior impasse do SUS hoje

A vigilância do mundo

O controle das doenças

Mas o que é saúde? Essa é uma pergunta para qual não há resposta única. Ela muda de acordo com a época, o lugar e a conjuntura social, econômica, política e cultural. No Brasil, deixou de ser apenas a ausência de doenças e se tornou um direito social a partir de 1988. Isso mudou a vida dos brasileiros e possibilitou a criação de um sistema de saúde reconhecidamente modelo para outros países, mas mal conhecido em seu país de origem.

Todos usam o SUS

O SUS é mais amplo do que a assistência médica, mas é normal e até esperado que boa parte da população não perceba isso. As pessoas geralmente só pensam na saúde quando perdem ela. A maioria não fica pensando na prevenção de doenças ou de riscos à saúde. O pesquisador Jairnilson Paim, docente da UFBA e autor de estudos sobre o SUS e a Reforma Sanitária, explica que historicamente a organização do sistema deu muito mais ênfase, em termo de recursos e pesquisas, para a assistência. “É muito mais visível o hospital e o posto do que a ação em uma comunidade”, afirma.

Muita gente não sabe, mas o SUS vai além dos serviços prestados em postos de saúde e hospitais públicos e privados. Vai além da consulta e dos procedimentos médicos e inclui várias ações de prevenção como controle da qualidade da água, alimentos e remédios, vacinação de pessoas e animais e monitoramento das doenças. Tudo isso faz parte do sistema público de saúde brasileiro, ainda que não seja divulgado como tal.

“Quando você vê o símbolo da Agência de Vigilância Sanitária (Anvisa), não tem ali que é SUS. Quando você vê as ambulâncias do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu), é nenhum momento você vê o sinal do SUS. Quando falam da Fiocruz, muitos não lembram que é SUS. Os próprios governos, as próprias instituições escamoteiam de suas comunicações o ideário do SUS. Há muito mais interesse em divulgar a marca do governo Dilma do que a marca do SUS”, critica Paim.

Não é política de inclusão social

“O SUS é um modelo mais eficaz do que o anterior. Tanto que um grupo do Haiti veio ao posto de saúde para conhecer o sistema. Ficaram admirados, para eles deve ter parecido que funciona, mas nós sabemos que não é bem assim. Era para ser bem melhor”. O depoimento de Vanderley Paiva, agente de combate às endemias da Secretaria Municipal de Saúde, resume a opinião de muita gente. O sistema único de saúde era mesmo para ser melhor.

O SUS é universal, foi criado para todos os cidadãos, sem exceção. Isso significa que todos os brasileiros, e até estrangeiros que passem pelo país, tem direito ao acesso aos serviços de saúde. Não foi sempre assim, antes de a saúde se tornar um direito na Constituição de 88 os brasileiros eram divididos em três grupos: os que podiam pagar por planos de saúde privados; os que trabalham com carteira assinada e tinham a assistência médica garantida pela previdência social; e aqueles que simplesmente não tinham direito algum e dependiam dos hospitais de caridade.

Mais do que um sistema para aqueles que antes estavam excluídos, o SUS foi concebido e regulamentado para atender todos os cidadãos e não para ser um sistema complementar para os mais pobres. E esse atendimento tem que ser integral, o sistema tem que assistir o usuário em todas as suas necessidades, inclusive a de ser bem cuidado; e baseado na equidade, ou seja, mais para quem mais precisa. Em poucos países esse cuidado com a saúde é direito constitucional e esse é um dos motivos para o SUS ser um modelo.

Paim afirma que ver o SUS como uma política de inclusão, e não como um sistema para todos, é uma armadilha. “Há um viés muito grande, inclusive da mídia,de trazer o SUS como uma coisa de pobre. Eu temo que ao enfatizar a questão de uma ampla política de inclusão fique parecendo que o SUS não é, por exemplo, para a classe média ou para as chamadas elites. É parcialmente correto, mas tem essa armadilha que tem sido muito reforçada para justificar um sistema segmentado, um SUS para os pobres, os planos de saúde para a classe média e os planos de saúde especiais para os ricos”, afirmou. Para Paim, isso reflete na falta de apoio político ao sistema e, consequentemente, no financiamento destinado a ele. Veja na segunda matéria da série os impasses no financiamento do sistema.

SUS é militância

Militância é a prática de lutar por uma causa ou ideia, se engajar. Na criação do SUS, a militância pela democratização foi a principal matéria-prima. A luta social do movimento da Reforma Sanitária, nascido no final da década de 70 em oposição ao autoritarismo do regime militar, resultou em mudanças no acesso e na própria concepção de saúde no país.

O movimento sanitário propunha uma reforma social. As diversas mudanças tinham como cerne a democratização da sociedade e do Estado – suas burocracias, aparelhos e práticas – e a saúde estava no meio de tudo isso. A reorganização das práticas de saúde deveria ser realizada em torno de três pilares:  atendimento integral ao cidadão, que inclui assistência e ações preventivas; descentralização das ações; e participação da comunidade.

No conceito ampliado regulamentado pela Constituição Federal (CF) de 88, a saúde é vista como qualidade de vida. Indicadores de mortalidade e de doenças infecciosas não são mais suficientes para determinar o estado de saúde de uma população. Esse novo conceito considera determinantes como alimentação, moradia, saneamento, meio ambiente, entre outros. Cabe ao SUS agir em torno desses fatores e ao Governo formular políticas públicas que sustentem o sistema.

*Inês Costal é Jornalista e Pós-Graduada em Jornalismo Científico pela Faculdade de Comunicação da UFBA.

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