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Atualizado em 22 DE outubro DE 2011 ás 15:06

Bromélias detectam metais pesados no ar de Salvador e Rio de Janeiro

Estudo pioneiro da Ufba e UFRJ revela concentração de chumbo, cádmio e cobre nas duas capitais. Em Salvador, bairro do Comércio tem o ar mais poluído

Por Raíza Tourinho*
raizatourinho@yahoo.com.br

Buzinas, congestionamento, carros. Além do barulho e do estresse que as dezenas de quilômetros de veículos enfileirados causam aos condutores e passageiros, nas grandes cidades os automóveis são responsáveis por um perigo quase invisível: a poluição atmosférica. Foi essa a conclusão de um estudo, que visa detectar a presença de metais pesados nas partículas que circulam no ar da capital baiana e fluminense, realizado por pesquisadores das universidades federais da Bahia (Ufba) e do Rio de Janeiro (UFRJ), que revelou ainda que o Comércio é o bairro que tem o ar mais poluído em Salvador.

Coordenado em Salvador pela farmacêutica Nelzair Vianna, da Secretaria Municipal de Saúde, em parceira com professor do Instituto de Ciências Biomédicas da UFRJ, Leonardo de Andrade, o biomonitoramento constatou que o ar que se respira contém elementos tóxicos para a saúde humana nas duas cidades.

Os pesquisadores utilizaram a bromélia conhecida como barba-de-velho (Tillandsia usneoides), espécie presente nas matas brasileiras, para realizar o biomonitoramento do ar, verificando a concentração de cinco elementos considerados extremamente tóxicos – chumbo, cromo, cádmio, cobre e zinco. A planta foi escolhida devido às características que favorecem sua implantação para este fim: com uma raiz que serve apenas para fixar-se no solo, a espécie retira todos os nutrientes que necessita do ar, através das escamas que recobrem seu corpo, além de se adaptar bem a condições climáticas extremas. O método é considerado eficiente e de baixo custo.

Pioneiro em Salvador, o estudo gerou resultados concretos que já podem ser visualizados nas avenidas da capital: as miniestações de monitoramento do ar. “A intenção não era mostrar somente um retrato da cidade, mas fornecer dados para políticas públicas que mitiguem de alguma forma esse impacto”, afirma Nelzair. Apesar de satisfeita com o passo que foi dado devido à sua pesquisa, a farmacêutica alerta para a necessidade de mudanças mais efetivas. “Não é só melhorar o combustível utilizado, mas também o transporte público. Nós esperamos que a poluição seja vigiada pelo poder público”, diz.

Nelzair: “a intenção é também fornecer dados para políticas públicas que mitiguem esse impacto”

Poluição – As bromélias ficaram expostas durante 90 dias por ano, entre 2006 e 2008, divididas nas estações verão e inverno. As plantas ficaram, geralmente, a 2,5 metros de altura, para absorver os componentes que poderiam ser inalados pelas pessoas. Foram monitoradas sete regiões de Salvador (Subúrbio Ferroviário, Comércio, Brotas, Dique, Pituba, Barra e Stella Maris) e cinco locais no Rio. Para servir de comparação, as amostras foram transplantadas de dois locais sem poluição: o Parque Nacional do Itatiaia (RJ) e a cidade de Cordeiro, na região serrana do Rio de Janeiro.

Foram encontradas concentrações prejudiciais semelhantes de chumbo, cádmio e cobre nas duas cidades, sendo que o zinco e o cobre tiveram concentrações mais elevadas no Rio. Um relatório divulgado no final de setembro pela Organização Mundial de Saúde (OMS) apontou que o nível de poluição atmosférica da Região Metropolitana do Rio de Janeiro é quase duas vezes maior ao da Região Metropolitana de São Paulo e ainda supera metrópoles como Nova York, Londres e Paris.

Na Bahia, as concentrações de chumbo mais acentuadas foram encontradas no bairro da Pituba durante o verão.  Apesar de ser considerado o ar menos poluído das regiões pesquisadas, o bairro de Stella Maris apresentou elevadas concentrações de cádmio juntamente com a Barra. “Nos surpreendeu. É uma área com trafego menos intenso, no entanto poderia estar relacionado com a proximidade ao aeroporto, já que o combustível utilizado pelas aeronaves contém cádmio na sua composição”, explica Nelzair, indicando uma associação provável entre o elemento e o bairro, próximo ao aeroporto. No entanto, na balança dos níveis das substâncias nenhum bairro foi mais impactado pela poluição do que o Comércio.

Comércio – O cenário defronte à minúscula barraca que o chaveiro Olímpio Soares trabalha há 30 anos, pouco mudou: carros, pessoas, navios, paredões de edifícios, apesar de mais modernos, continuam regendo o ritmo agitado no dia a dia do bairro Comércio. Apesar de nunca ter sofrido com problemas respiratórios, Soares teve a audição prejudicada pelo barulho dos motores. Ele não acredita que o ar do Comércio seja mais poluído do que o restante da cidade. “Só sinto o ar melhor mesmo quando vou para o interior. Aqui está pior e vai piorar cada dia mais”, dispara. Os motivos para tal crença está no próprio caminho entre o trabalho e sua casa: o trajeto de 11 quilômetros entre o bairro de Tancredo Neves e o do Comércio chega a durar duas horas. Quatro das 24 horas do dia perdidas em engarrafamentos. “Daqui a cinco anos vai ser pior”.

Número de veículos e grande concentração de prédios dá ao Comécio o título de bairro mais poluido

De acordo com a pesquisadora da Ufba, o intenso tráfego de veículos, o porto de Salvador e a topografia de paredões de prédio facilita o título de bairro que concentra mais o ar mais poluído. Até mesmo porque essas partículas viajam centenas de quilômetros. “Não existe delimitação geográfica. Estudos já revelaram que partículas da Floresta Amazônica chegam a São Paulo e da costa da África em Arembepe”, conta Nelzair.

Assim, somente como políticas públicas locais talvez não seja possível evitar a globalização da poluição atmosférica, mas a farmacêutica explica que ações locais podem minimizar o impacto da  poluição mais direta e concentrada, que atinge as pessoas próximas.

O próximo passo da pesquisa, aliás, é avaliar o risco para as pessoas, relacionando os danos à saúde provocados por esses elementos e a população soteropolitana. A ciência já sabe que os malefícios à saúde humana provocados pelos metais particulados são muitos. O chumbo, por exemplo, traz complicações renais, anemia crônica e déficit cognitivos. O cádmio geralmente se deposita nas células dos ossos e próstata, podendo causar danos a esses órgãos. Em excesso, mesmo o zinco, considerado essencial ao organismo humano, provoca danos como o estresse oxidativo. “Às vezes a brisa do mar nos passa a sensação que estarmos protegidos, mas não estamos”, enfatiza Nelzair.

*Estudande de Jornalismo da Faculdade de Comunicação da Ufba – Facom

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Um comentário a Bromélias detectam metais pesados no ar de Salvador e Rio de Janeiro

  1. excelente pauta para a mídia ambiental e cddadã_grato pelo tema e abordagem

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