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Atualizado em 13 DE maio DE 2011 ás 00:51

O compromisso social dos pesquisadores baianos com a divulgação cientifica

Nos países em desenvolvimento, temos a necessidade de participar à comunidade o conhecimento científico e seus benefícios. Mas é fundamental entender que a Ciência vende jornais e influencia as estratégias industriais e as transformam, modificam as economias nacionais, prolongam a vida das pessoas

Simone Bortoliero*
bortolie@gmail.com

A divulgação cientifica, inicialmente, tem o papel de descomplicar a ciência para o cidadão comum, tornando-a digerível e compreensível, além de tentar aproximar os cientistas dos debates da atualidade. Mas divulgar ou popularizar o conhecimento cientifico não pode ser entendida como uma tarefa de pessoas abnegadas.

É importante que a divulgação cientifica seja incorporada como política pública e temos bons exemplos no Brasil a começar pela Semana Nacional de Ciência e Tecnologia, criada em 2004, na primeira gestão do então presidente Lula. De lá prá cá, governos estaduais e instituições de pesquisa, como no caso da Bahia, incorporaram essa política, criando editais específicos como o POPCiências, que permitem a consolidação da pesquisa na área, além de promover eventos no estado com a tentativa de democratizar o conhecimento cientifico. E democracia pressupõe participação.

Portanto, convido os pesquisadores baianos para exercitar a divulgação cientifica na nova Agência de Noticias em CT&I da Bahia, cujo nome é Ciência e Cultura, que vem sendo construída pelo Curso de Especialização em Jornalismo Cientifico da Facom-Ufba, em parceria com a Fiocruz-Bahia, Associação Brasileira de Jornalismo Cientifico – ABJC, Faculdade de Tecnologia e Ciências – FTC, e conta com apoio da Fapesb.

Tornar a ciência acessível à maioria, seja através de ações na Semana Nacional de CT&I, conceder uma entrevista para a grande mídia ou para as agências de noticias, manter um blog de ciência entre outras atividades, pode ser considerado tão importante como publicar para um publico especializado numa revista conceituada pela Capes. Ambas as situações tem seus objetivos específicos e podem ser consideradas relevantes para quem quer tornar público o conhecimento. Na divulgação, o reconhecimento se dá pela inclusão social e já no segundo caso, o da disseminação em revistas especializadas, ele ocorre pelo reconhecimento dos pares e pelo avanço da própria ciência. Dada a importância da divulgação e da disseminação para seus públicos, penso que a balança não deve tender para um dos lados, quando o que está em jogo é a comunicação pública.

Recentemente, autores vêm trabalhando o conceito de Cultura Cientifica, compreendendo uma dinâmica que envolve os setores produtores de conhecimento, as instituições com seus pesquisadores, a formação de mestres e doutores, o conjunto de ações e atividades realizadas pelos centros de ciência e museus, além de contemplar as tecnologias de comunicação que divulgam conhecimento cientifico através de programas televisivos, imprensa escrita, rádio e internet. Incluiria o próprio ensino de ciências com seus professores e alunos e as políticas públicas em CT&I com seus editais.

Nessa dinâmica encontramos a divulgação cientifica realizada pela mídia brasileira, seja alternativa, tradicional ou especializada, feita por jornalistas científicos.

Tanto os jornalistas como os pesquisadores brasileiros preocupados com a divulgação científica devem se perguntar inicialmente a quem pertence o conhecimento num país de tantas desigualdades sociais e de um profundo descaso com a educação científica.

Com tanta desigualdade no sentido do acesso à informação cientifica, além de um padrão também desigual nos níveis da educação científica (educação forma) da população brasileira, será possível falar em divulgar ciências para o grande público?

Creio que sim. As experiências dos Museus de Ciências, planetários, oceanários, entre outras são ricos nessa aproximação da ciência com a sociedade e tem recebido do governo federal através do Ministério de CT&I verbas significativas nos recentes editais do CNPq. Mas esses espaços lúdicos não podem ser responsáveis pela educação cientifica dos jovens brasileiros. Locais que recebem milhares de alunos vindos da escola pública todos os anos e ávidos por conhecimento.

Os que trabalham nessa frente da divulgação cientifica tem o contato direto com a população. Já os que atuam nas mídias nem tanto.

Primeiro gostaria de chamar a atenção dos pesquisadores baianos para o fato de que a divulgação científica não é uma simplificação – se o fosse deformaria a realidade científica. Outro aspecto relevante é que o modelo de divulgação cientifica midiática no Brasil foi sendo constituído desde a década de 1980, com uma parceria entre jornalistas e pesquisadores de diferentes áreas do conhecimento através das assessorias de comunicação das universidades públicas como a USP e a Unicamp, para citar como exemplos.

Essas parcerias também se deram nos bons programas de ciência na TV, nas revistas de qualidade que circulam na banca como as patrocinadas pela Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência – SBPC, que é o caso da Revista Ciência e Cultura. Sem as parcerias entre setores e profissionais não haveria possibilidade de uma divulgação científica que contemplasse tantas áreas distintas do conhecimento e suas especificidades. Assim, através de assessorias de comunicação das Universidades Estaduais, de instituições como a Fiocruz, Embrapa, das Instituições Federais de Ensino Superior podemos ver, ouvir e ler as noticias de ciência e tecnologia e inovação das últimas décadas.

Ou seja, o papel do pesquisador deve ser o de querer transmitir seus conhecimentos para uma ampla maioria sem acesso aos benefícios da ciência.

Mas quando falo em beneficio, quero dizer que uma divulgação cientifica responsável de seu papel com a cidadania, também prevê apresentar os erros e acertos dessa comunidade científica, os seus lobby, as lutas de grupos hegemônicos, a cobrança e a implementação da política cientifica e tecnológica no estado, além de outros aspectos que circundam o universo da produção do conhecimento.

Como unir esses dois lados, jornalistas e pesquisadores, numa interface que resulte em benefício público.

Temos na Ufba a ausência de uma cultura acadêmica que aprecie a divulgação cientifica, não como leitura no sofá de casa, mas como exercício de cidadania. Essa comunidade faz pesquisa cientifica paga com o dinheiro do contribuinte e a esse público devemos prestar contas desse investimento. Tantos jornalistas como pesquisadores podem exercitar a prestação de contas através da garantia constitucional que prevê acesso a informação. Poderíamos ir além ao considerar o conceito de acesso como apropriação e bem público.

Por que é tão difícil para o cientista transmitir seus conhecimentos para um público que antes era chamado de leigo e atualmente já se sabe que de leigo não tem nada?

Nos países em desenvolvimento temos a necessidade de participar à comunidade o conhecimento científico e seus benefícios. Mas é fundamental entender que a Ciência vende jornais e influencia as estratégias industriais e as transformam, modificam as economias nacionais, prolongam a vida das pessoas.

O avanço do conhecimento sanitário, por exemplo, fez com que milhões desfrutassem níveis de saúde e de bem estar. Mas nem o conhecimento, nem a cultura, nem o bem estar, nem a riqueza, nem a informação, estão distribuídos equitativamente.

A ciência é a opção dos pesquisadores para explicar o mundo natural, social e humano. Temos uma diversidade cultural imensurável e os saberes, que não os científicos, devem ser levados em consideração quando continuamos tendo a idéia de que do outro lado do aparelho de TV, do jornal ou da internet, têm interlocutores.

Mas se queremos convidar os pesquisadores da Bahia para a ação concreta da divulgação, sabendo das dificuldades que se apresentam diariamente na relação mídia X pesquisa, deixamos aqui algumas dicas para o divulgador científico quando estiver diante do impasse de dar uma entrevista para a mídia local, nacional ou internacional e até se fazer entender pelos estudantes da Agência de Notícias em CT&I da Bahia

  • Ajude a combater os medos daquilo que não conhecemos
  • Desafios: fale o necessário, vá direto ao ponto central da pergunta, não dê voltas, seja direto, pois em Televisão o repórter tem apenas 1 minuto e 20 segundos para falar de uma tese de doutorado que você levou quatro anos para chegar a um resultado. Não o culpe, ajude-o a esclarecer o que parece nebuloso em seu trabalho.
  • Se for uma entrevista, verifique se vai sair na íntegra, pois quando os pensamentos são transcritos para o papel muita coisa toma um sentido diferente
  • Esclareça o jornalista usando uma linguagem simples, descomplicada e tenha a absoluta certeza que você foi compreendido por ele ou ela, caso contrário ninguém vai entendê-lo.
  • Diminua as confusões entre estudos com provas e análises que sugerem hipóteses, ou seja, explicite mais de uma vez que os resultados ainda estão longe, que temos um longo percurso pela frente. Lembre-se que notícia para a mídia brasileira é algo de impacto, por isso todos são loucos por novidades e por resultados. Mas, convença o repórter de que há um processo científico e que a escolha de um método pode definir o resultado de seu trabalho.
  • Se sua pesquisa não é aplicada, lembre-se vai ser difícil sair na primeira página do jornal ou ter destaque na manchete da TV. Ciência para os jornais tem o sentido da aplicabilidade, daí pesquisa básica ter espaço reduzido.
  • Faça associações entre sua pesquisa e o desenvolvimento econômico, social, cultural e humano do pais ou do mundo.
  • Para os pesquisadores da matemática, da física, da química e das engenharias faça relações diretas com o cotidiano das cidades, abuse das analogias.
  • Se for no campo da Saúde, mostre que os resultados podem ser transformados em políticas públicas e isso terá um impacto direto na sociedade.
  • Se nada disso der certo, tente o bom senso, o equilíbrio e o respeito ao trabalho de um colega que tem uma rotina oposta ao do pesquisador, o que chamamos nas redações de rotina produtiva, onde o tempo oprime e é a figura central do exercício profissional.


Uma impasse a ser resolvido na Universidade Federal da Bahia, é a falta de colaboração dos pesquisadores com a imprensa no sentido de não responder emails, não se disponibilizam para o agendamento de entrevistas, não atualizam seus emails e fones para contatos nos departamentos, sem falar é claro dos sites dos cursos de pós-graduação onde não encontramos nada e ninguém. Da próxima vez que entrar no site do seu curso de Pós-Graduação haja como um jornalista e tente descobrir um pesquisador da Ufba, o que ele faz e como pode entrar em contato com ele. Você verá o grande desafio que temos em pleno Século XXI, conseguir falar com um pesquisador local. Isso explica a cobertura local com fontes cientificas do eixo Rio – São Paulo.

Divulgação Cientifica não é ter disponíveis teses e dissertações nos sites dos cursos de Pós-Graduação, isso tem função relevante, mas não significa fazer divulgação cientifica, a linguagem e o tempo são outros, bem como o objetivo e o público.

Temos, portanto, na Universidade Federal da Bahia, um longo caminho a percorrer que não nos é dado pelo simples acesso ao currículo Lattes dos pesquisadores e nem pelos grupos de pesquisa cadastrados no CNPq. Temos que superar a desconfiança nos jornalistas e valorizar os que estão se qualificando para cobrir temas de ciência, tecnologia e inovação.

Participem divulgando suas pesquisas em www.cienciaecultura.net/agencia

*Coordenadora do Curso de Especialização em Jornalismo Cientifico e Tecnológico, professora da Facom-Ufba e Vice-Presidente da ABJC (2009-2011)

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