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Atualizado em 22 DE março DE 2013 ás 18:32

Condições de vida interferem na disseminação da tuberculose

O Brasil está entre os 20 países que apresentam maiores números de casos de tuberculose no mundo. Diagnóstico e tratamento da doença são simples e podem ser acessados gratuitamente nas unidades públicas de saúde, mesmo assim a população carece de informação.

*NÁDIA CONCEIÇÃO
nadconceicao@gmail.com

No próximo dia 24, será comemorado o dia internacional de controle da tuberculose, doença infecciosa que é transmitida pelo bacilo da tuberculose através da micobactéria tuberculoses, agente da tuberculose. De acordo com a pesquisadora e professora do Instituto de Saúde Coletiva (ISC) da UFBA, Susan Martins Pereira, que realiza diversas pesquisas sobre a doença, uma pessoa pode se contagiar tendo contato com outra infectada. Indivíduos suscetíveis podem adquirir a doença, inicialmente, sob a forma de uma infecção assintomática, sendo que em alguns casos, no período de dois anos, a doença pode evoluir para um quadro mais amplo.

Por mais antiga que a doença seja e por mais facilidade em diagnosticar e tratar, muitos casos ainda não são diagnosticados precocemente. Em algumas pessoas, o bacilo da tuberculose supera as defesas do sistema imunológico e começa a se multiplicar, resultando na progressão de uma simples infecção por tuberculose para a doença em si. Essa situação pode acontecer logo após a infecção (tuberculose primária), ou vários anos após a infecção (reativação da doença tuberculosa, ou bacilo dormente).

Segundo dados do programa estadual de controle a tuberculose, com o bacilo da tuberculose, apenas cerca de 10% dos indivíduos desenvolvem a doença em algum período da vida; cerca de 5% das pessoas infectadas desenvolverão a doença nos dois primeiros anos, e 5% irão desenvolvê-la ainda mais tarde. No total, aproximadamente 10% dos infectados que possuem um sistema imunológico normal desenvolverão a doença durante a vida.

O Brasil está entre os 20 países que apresentam maiores números de casos de tuberculose no mundo. Segundo Pereira, a incidência de casos é mais comum no ambiente urbano, informação também confirmada na pesquisa do mestrando Carlos Vinicio Erazo Cheza com o tema “Estudo da distribuição das condições de vida em Salvador: uma análise espacial”, e a pesquisa “Distribuição espacial da mortalidade por tuberculose e sua relação com as condições de vida” desenvolvida também no ISC.

O objetivo da pesquisa foi identificar os padrões de distribuição espacial da taxa de incidência da tuberculose, assim como estimar a associação entre as condições de vida das populações e as taxas medias de tuberculose nos bairros de Salvador nos anos 1995-1996 e 2004-2005.

Para Susan, a presença do bacilo, é fundamental para infecção, mas não é o único. A infecção é, muitas vezes, facilitada por características biológicas e sociais. No caso biológico, ”pessoas infectadas com HIV e algumas doenças crônicas como a diabetes têm mais probabilidade de serem contagiadas pela da tuberculose. Já quanto às questões sociais, o favorecimento ao contágio está no ambiente, que se torna mais vulnerável devido à pobreza e a intensa aglomeração pessoas por domicílios e em casa insalubres”, disse.

O Programa Nacional de Controle da Tuberculose (PNCT) definiu como prioritárias, para desenvolverem a doença, as populações em situação de rua, as que estão privadas de liberdade, a população indígena e as pessoas que vivem com HIV/AIDS. Em 2011, no âmbito da população privada de liberdade (PPL), a incidência da tuberculose foi de 1.037,7 por grupo de 100 mil pessoas e, na população indígena, de 95,5/100 mil. A coinfecção Tuberculose/HIV, no Brasil, é de 9,9%, mas nos Estados da Região Sul do País é praticamente o dobro (18,6%). Pensando nesse público, o PNCT, juntamente com o Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais, resolveu conduzir um projeto de atividades colaborativas em Tuberculose/HIV na região.

Casos

No Brasil são cerca de 90 mil casos por ano, o que equivale a 70 casos para cada 100 mil habitantes. A incidência maior é entre homens jovens em idade produtiva, a partir dos 15 anos de idade; aos 20 anos a incidência é triplicada.

Na Bahia, segundo dados da Secretaria de Saúde do Estado (SESAB) e do Programa Estadual de Controle a Tuberculose, foram registrados quase 6 mil casos. De acordo com os últimos casos consolidados do Ministério da Saúde, de 2011, a Bahia tem uma taxa de incidência de tuberculose de 37,3 casos para cada 100 mil habitantes. Apesar de ainda alta, ela é quase a metade do que se encontrava em 1990, quando a medição começou a ser feita.

Nos primeiros meses de 2013, dados divulgados pela Secretaria apontam 3.112 casos de tuberculose; 1.357 casos ocorreram em Salvador, que ocupa a primeira posição em número de casos, seguida de Feira de Santana, com 114 ocorrências. Ilhéus aparece na terceira colocação, com 72 casos de tuberculose. Itabuna aparece em quarto, com 62 notificações. Juntos, os municípios do sul da Bahia registram 230 casos de tuberculose.

Além de Itabuna e Ilhéus, foram feitas notificações em Canavieiras, Coaraci, Ibicaraí, Ubaitaba, Arataca, Buerarema, Almadina. E ainda em Floresta Azul, Gandu, Dário Meira, Ibicuí, Ibirapitanga e Itaju do Colônia e Itajuípe.

Diagnóstico

No diagnóstico laboratorial, 86,7% dos casos pulmonares são diagnosticados por baciloscopia (exame de uma amostra de secreção expelida na tosse, onde é possível identificar se existe a presença do bacilo). Outra forma de diagnóstico é a realização de um raio X do tórax e a cultura. Apenas dois estados do País apresentaram valores inferiores a 80%. A OMS e o Ministério da Saúde recomendam que haja a realização do exame de cultura e do teste de sensibilidade para todos os casos de retratamento, com o objetivo de diagnosticar precocemente a resistência. De 2001 a 2010, a realização de cultura aumentou 156% para os casos de retratamento, sendo 24% superior apenas no último ano.

O percentual de cura dos casos novos bacilíferos de tuberculose pulmonar é o principal indicador utilizado para avaliar as ações de controle da tuberculose nas esferas nacional, estadual e municipal. As metas recomendadas pela OMS são de detectar 70% e curar pelo menos 85% dos casos para começar a reverter a situação da tuberculose em suas localidades, sendo que o abandono não deve ultrapassar 5%. O Brasil detectou 88% dos casos estimados pela OMS para o ano de 2010; porém, o alcance do percentual recomendado pela Organização, para o indicador de cura, ainda se constitui como um desafio. Para atingir tais metas, o Brasil precisa de um incremento de 15% na cura e de uma diminuição de 50% do abandono do tratamento por pacientes com Tuberculose.

O diagnostico tardio, segundo a pesquisadora, se dá pelo fato da tuberculose ser uma doença muito antiga e as pessoas conviverem com ela sem muita tensão e, de certa forma, mesmo com o risco de morte e a probabilidade de cura, muitos casos se tornam graves pela falta dos cuidados iniciais. “Há doenças que causam mais comoção, onde as pessoas se sentem mais ameaçadas ou desprotegidas”.

O raio-x é uma das formas de diagnosticar a tuberculose.

Dessa forma, “a relação da tuberculose com a sociedade não é de medo, porque elas vêm a tuberculose como uma doença tratável e curável. Se o doente realizar o tratamento de seis meses em geral ela tem bom índice de cura. O tratamento para curar a tuberculose é conhecido e eficaz. O medo é mais por questões culturais, a tuberculose é conhecida há muitos anos, Castro Alves morreu de tuberculose, pessoas importantes e poetas morreram por ter essa doença e em uma época onde não havia tratamento”, esclarece a pesquisadora.

Ela afirma, ainda, que o preconceito com relação à palavra tuberculose se mantém, desde a década de 40, mesmo havendo um tratamento que é disponibilizado no sistema público de saúde. “O que leva a persistência e manutenção da doença no nosso meio é que permitem as questões de vulnerabilidade das pessoas, que pode não ter acesso ao sistema de saúde no período adequado e passarem muitos anos sem tratamento e não conseguir ter o diagnóstico nem conter a transmissão da doença”.

A pesquisadora esclarece que o tratamento é padronizado em todo Brasil, feito com 4 drogas durante 6 meses, com uma dose única pela manhã. “É um tratamento relativamente fácil, sendo que o paciente tem um período para que ele possa realmente ser curado”.

Sintomas

É considerado como caso suspeito de tuberculose um indivíduo que apresenta tosse e febre por pelo menos três semanas ou mais. Segundo Pereira, em alguns casos, o paciente não é encaminhado para o tratamento adequado. Os sintomas são confundidos com outras doenças como a gripe, e o médico acaba prescrevendo um tratamento a base de antibióticos. “Nós dizemos que a tuberculose é uma doença insidiosa, pois o que acontece é uma febre vespertina; no outro dia o paciente amanhece bem, mas no outro a febre volta. Os sintomas não são aparentes e, muitas vezes, o paciente procura o médico por conta de uma gripe e nem sempre o médico diagnostica a tuberculose”, explica a pesquisadora.

ISC e programas governamentais

O ISC, segundo a pesquisadora, tenta realizar seus projetos com a parceria do município de Salvador, com o Estado e com o governo Federal para desenvolver ações de controle da tuberculose. “Nossa relação com SESAB é através dos técnicos que participam de nossas reuniões. Com o programa municipal, temos o auxílio quando precisamos implementar um projeto e eles nos ajudam na interlocução com os órgãos de saúde. Nossa intenção é, juntamente com o Ministério da Vigilância e Saúde, unir força e complementando os olhares, o de pesquisador e o de gestor, sobre o mesmo objetivo, que é de controle à tuberculose”.

Através de uma parceria com o Ministério da Saúde será realizado um projeto de avaliação do impacto do Programa Bolsa família, financiado pelo Programa Nacional de Controle a Tuberculose. A partir dele serão analisado os efeitos de programas sociais na mortalidade e na diminuição das internações de pessoas infectadas pela tuberculose. A intenção é explorar como a tuberculose está relacionada às condições sociais.

Outros projetos do grupo de pesquisa do ISC também serviram como norte para as ações do governo, como a aplicação da segunda dose da vacina BCG, que protege crianças do contagio da doença. A pesquisadora afirma que as pesquisas do ISC, realizadas há 10 anos, comprovaram a ineficácia da segunda dose da BCG, que era aplicada como reforço. “Avaliamos o não efeito dela, pois não trazia uma redução na incidência da doença. A partir dessa comprovação, o Ministério da Saúde suspendeu a aplicação da vacina em todo país”.

Para discutir mais sobre um tema tão importante para a sociedade, o Instituto de Saúde Coletiva (ISC) vai promover entre os dias 24 e 26 de julho, o IV EPTB: IV Encontro de Pesquisa e Inovação em Tuberculose na Bahia. O evento acontece todos os anos e tem como objetivo congregar pesquisadores do Brasil, com convidados internacionais. A abertura será realizada na Reitoria da UFBA. Nos outros dias, também no salão nobre da Reitoria, serão realizados cursos e palestras.

*Nádia Conceição é jornalista, estudante de Produção Cultural da UFBA e bolsista da Agência de Notícias Ciência e Cultura.

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